sábado, 5 de janeiro de 2013

O Anglicanismo ( Trabalho apresentado a disciplina de fenomenología da religião em 2012)


O ANGLICANISMO

1.  HISTÓRIA

Ao contrário dos primeiros movimentos protestantes que tomaram conta da Europa no século XVI, o anglicanismo surgiu em torno de questões que envolviam diretamente os interesses da monarquia britânica. Na Inglaterra, o rei Henrique VIII (1491 - 1547) teve grande importância na consolidação da reforma religiosa.

Henrique VIII e a Igreja já tinham uma relação pouco harmoniosa quando, no ano de 1527, o rei inglês exigiu que o papa anulasse seu casamento com a rainha espanhola Catarina de Aragão. Henrique VIII alegava que sua esposa não teve condições para lhe oferecer um herdeiro forte e saudável que desse continuidade à sua dinastia. O papa Clemente VII resolveu não atender as súplicas do monarca britânico. Inconformado, Henrique VIII obrigou o Parlamento britânico a votar uma série de leis que colocavam a Igreja sob o controle do Estado. Wilges afirma:

 

Em vista disso o soberano conseguiu do parlamento o ato de supremacia  que o proclamava chefe da Igreja da Inglaterra. Segundo a Igreja Anglicana ele separou a Igreja do Papa, interrompeu a comunhão com Roma, mas não com a fé católica e apostólica (WILGES, 1984, p.86).

 

No ano de 1534, o chamado Ato de Supremacia criou a Igreja Anglicana. Segundo os ditames da nova Igreja, o rei da Inglaterra teria o poder de nomear os cargos eclesiásticos e seria considerado o principal mandatário religioso. A partir dessa nova medida, Henrique VIII casou-se com a jovem Ana Bolena.  Além disso, realizou a expropriação e a venda dos feudos pertencentes aos clérigos católicos.

Essa medida fez com que os nobres, fazendeiros e a burguesia mercantil passassem a exercer maior influência política. No governo de Elizabeth I , novas medidas foram tomadas para reafirmar o poder da Igreja Anglicana. Alguns dos traços do protestantismo foram incorporados a uma hierarquia e uma tradição litúrgica ainda muito próximas às do catolicismo. Essa medida visava minimizar a possibilidade de um conflito religioso que desestabilizasse a sociedade britânica. No seu governo foi assinado o Segundo Ato de Supremacia, que reafirmou a autonomia religiosa da Inglaterra frente à Igreja Católica.

Pelo Ato dos Seis Artigos, assinado em 1539, Henrique VIII mantinha todos os dogmas católicos, exceto o da autoridade papal. Esta dubiedade foi atacada tanto por protestantes como por católicos: os protestantes reprovavam a fidelidade aos dogmas católicos, e os católicos reprovavam o cisma. Eduardo VI, filho e sucessor de Henrique VIII, impôs ao país a obrigatoriedade do culto calvinista. Maria Tudor, sua sucessora, tentou, sem sucesso, restaurar o catolicismo. Com a morte de Maria Tudor, subiu ao trono Elizabeth I, (1558-1603), filha de Ana Bolena, que instituiu oficialmente a religião anglicana, através de dois atos famosos: o Bill da Uniformidade, que criava a liturgia anglicana, e o Rui dos 39 Artigos, que fundamentava a fé anglicana.

 

Essa é a parte da história que você conhece. Uma versão muito simplista, diriam os anglicanos. Segundo eles, o desejo de separação já estava presente bem antes desse episódio. Desde o século II, para ser mais exato. Naquele tempo, ainda não havia a religião católica. Existia apenas o cristianismo. Onde os apóstolos paravam, construíam uma igreja, que ganhava o nome do povo local. Na Grã-Bretanha, virou Igreja Celta: uma adaptação do cristianismo aos costumes, crenças e tradições da região No século VI, já a mando da Igreja Católica, santo Agostinho se estabeleceu na cidade inglesa de Cantuária, com o objetivo de converter os anglo-saxões. Virou o arcebispo de Cantuária e colocou a Inglaterra sob a tutela do Vaticano (VERONESE, 2008. s.p.).
 

 

Foi assim por quase 1 000 anos, até que o rei, particularmente sentindo-se afetado pelas regras do catolicismo, decidiu proclamar a independência.

 

2.  HIERARQUIA

A Igreja tem uma organização hierárquica, com bispos, daí o seu outro nome: a Igreja Episcopal. Aceitam o Tríplice Ministério através das Sagradas Ordens de bispos, presbíteros e diáconos, de acordo com o ensino da tradição da Bíblia e da Igreja. Obedientes ao mandato de Jesus Cristo, os cristãos são chamados à missão e ao evangelismo no poder do Espírito Santo.

A Igreja Anglicana caracteriza-se por uma forma de culto litúrgica mais semelhante à da Igreja Católica Romana do que das Igrejas Protestantes. Tradicionalmente, a organização foi dividida em facções da Igreja Alta (High Church) e Igreja Baixa (Low Church) e a Igreja Larga (Broad Church),que refletem a controvérsia histórica sobre as formas de culto e de expressão.

A Igreja alta admite o soberano como chefe da religião, a Igreja baixa “caracteriza-se pelo desprezo às formas exteriores de culto, pela leitura assídua da Bíblia, pela insistência em uma piedade pessoal e privada, por uma forte tendência anti-romana. Tendência calvinista”. (WILGES, 1984, p.87). A Igreja larga caracteriza-se pelo indiferentismo religioso teórico e prático.

3.     DOUTRINA, RITOS E SINAIS


 

3.1.        Princípios essenciais do Anglicanismo

Irineu Wilges(1984, p.87) aponta que os anglicanos acreditam que as Sagradas Escrituras contêm toda revelação necessária para que a humanidade alcance vida plena. Toda a doutrina e liturgia sustentam-se na Bíblia Sagrada. Os Credos Apostólicos, de Atanásio e Niceno, escritos no tempo da igreja indivisa, constituem a confissão normativa da fé católica que preservam ainda hoje. A igreja possui o poder de decretar ritos e cerimônias e tem autoridade em controvérsias de fé.

A Igreja Anglicana é uma igreja sacramental. Professam o Santo Batismo e a Santa Eucaristia como legítimos sacramentos diretamente ordenados por Cristo e instrumentos da graça salvífica de Deus. Professam que a autoridade transmitida por Cristo aos apóstolos e esses aos seus sucessores (incluindo seus bispos) é, ao mesmo tempo, garantia de que sua Igreja é católica e apostólica.

 

3.2.        Uma Igreja Sacramental

Os Sacramentos são sinais externos e visíveis de graças internas e espirituais. Para eles, o Batismo e a “Eucaristia” são sacramentos indispensáveis à vida cristã. Santo Batismo: A filiação à Igreja se dá pelo batismo com água e em nome da Santíssima Trindade. Nas igrejas anglicanas há liberdade para celebrá-lo por aspersão ou por imersão, de acordo com os usos e costumes de cada paróquia. Pessoas de qualquer idade podem ser batizadas em alguma Igreja cristã.

A Igreja Anglicana em hipótese alguma pratica o "rebatismo", em certos casos o batismo sob condição, crianças podem ser batizadas independente da situação matrimonial dos pais. Qualquer pessoa, uma vez batizada, tem direito de receber regularmente a Comunhão, inclusive as crianças. A comunhão  é o alimento espiritual dos cristãos e principal reunião pública de culto e adoração. Seus sinais externos e visíveis são o pão e vinho consagrados por um(a) sacerdote devidamente autorizado(a) pela sucessão apostólica.

A Igreja Anglicana proclama a presença real de Cristo na Eucaristia, mas não procura explicar dogmaticamente como se dá esse santo e profundo mistério. O culto eucarístico é aberto a todas as pessoas que dele queiram participar. É também momento de ouvir o Evangelho e a homilia dominical.

Outros ritos de caráter Sacramental são a Confirmação ou Crisma: Ministrada pelo(a) bispo(a), representa a maioridade na fé e confere a todo confirmado a dignidade do ministério leigo e a plenitude dos dons do Espírito Santo. Para ser confirmada, a pessoa precisa ser batizada, ter aceito Jesus Cristo de forma pessoal e consciente como seu Senhor e receber instrução catequética apropriada.

 A Igreja Anglicana celebra o matrimônio de acordo com as leis do país e desde que um dos noivos seja batizado. Os divorciados podem casar-se novamente, cumpridas as determinações canônicas da Igreja. Também é praticada a Unção e benção da Saúde, ministrada pelo sacerdote mediante a imposição das mãos a todos que se sentem abatidos de forma física, mental ou espiritualmente. O sacerdote, se julgar conveniente, pode administrar a benção com óleo consagrado pelo(a) bispo(a). A Penitência também conhecida como "Confissão e Absolvição" é ministrada por um sacerdote coletivamente (durante a liturgia) ou individualmente, assegura o perdão de Deus a todas as pessoas que se arrependerem de suas más ações e desejam reiniciar uma nova vida. "Àqueles a quem vocês perdoarem os pecados, esses serão perdoados" (João 20.23).

Ordenação: A Igreja ordena ao sagrado ministério pessoas que tenham recebido elevada preparação teológica para corresponder à dignidade do ministério. As ordens de diácono, presbítero e bispo são cumulativas, vitalícias e abertas a homens e mulheres solteiros(as) ou casados(as). A Igreja não exige aos sacerdotes o celibato.

 

4.     Igreja Anglicana: Católica e protestante

            Carlos Eduardo Calvani, no artigo “A tensão entre Substância Católica e Princípio Protestante no Anglicanismo” afirma: “A história da Igreja Anglicana é marcada por oscilações pendulares em relação ao catolicismo romano e ao protestantismo”.

A Igreja Anglicana busca equilibrar a tradição católica com as influências da Reforma protestante. Por isso ela é católica e também reformada. A liturgia preserva a mais antiga estrutura de culto cristão, com grande ênfase na proclamação da Palavra de Deus. Dão grande valor à Liturgia, definindo as crenças e doutrinas no próprio manual litúrgico (o Livro de Oração Comum). O LOC orienta as diferentes celebrações não segundo uma opinião individual, mas do consenso da Igreja como um todo. Para glorificação de Deus, além do LOC, a Igreja Anglicana também dá grande valor à arte sacra, ao altar, arquitetura dos templos e tudo que possa contribuir para expressar a fé em Deus: as flores, as cores litúrgicas, velas, incenso, música e a atmosfera de reverência diante de Deus.


 

O anglicanismo tenta se equilibrar entre o peso de tradições pré-reformadas (sobretudo na liturgia) e a influência de grupos protestantes às vezes bastante radicais. Essa atitude recebeu mais tarde a designação de “via-média”, expressão através da qual busca-se a identidade do anglicanismo num meio termo entre o catolicismo romano e o protestantismo clássico. As evidências dessa “via-média” ganham visibilidade em algumas peculiaridades anglicanas: tal como no catolicismo, há bispos com sucessão apostólica, padres e diáconos, mas semelhantemente ao protestantismo, não se exige de ninguém o celibato. Tal como no catolicismo, o centro da vida litúrgica é o altar e a comunhão eucarística, mas grande ênfase é dada na pregação. Utiliza-se terminologia tipicamente católica (diocese, paróquia, eucaristia, missa, sacristia, padre, etc) mas, ao mesmo tempo permite-se que padres sejam chamados de “pastores”, que a missa seja designada “culto” ou que a Eucaristia seja chamada simplesmente “Santa Ceia” ou “Ceia do Senhor”. Assim é o ethos anglicano – uma constante tentativa de acomodar diferenças em prol da preservação da comunhão. (CALVANI, 2006, p. 76-77)

 


Os anglicanos encontram muita alegria em sua Igreja, nutrindo por ela grande afeição. Em qualquer parte do mundo encontram no LOC a maneira familiar de adorar e compreenderem-se participantes de uma grande família cristã espalhada em 165 diferentes países e que tem como símbolo de unidade e comunhão a Sé de Cantuária. O Reverendíssimo Rowan Williams é o 104o Arcebispo de Cantuária. Ele foi entronizado na Catedral de Cantuária no dia 27 de fevereiro de 2003.

 

CONCLUSÃO

Igreja Anglicana é a Igreja cristã estabelecida oficialmente na Inglaterra e é a matriz principal da atual Comunhão Anglicana ligada à Sé de Canterbury, Inglaterra. Fora da Inglaterra, a Igreja Anglicana é geralmente denominada de Igreja Episcopal, principalmente nos Estados Unidos da América e países da América Latina.

A Igreja da Inglaterra compreende-se como católica e reformada: Católica, na medida em que se define como uma parte da Igreja Católica de Jesus Cristo, em perfeita e válida continuidade com a Igreja apostólica e universal.

Reformada, na medida em que ela foi moldada por alguns dos princípios doutrinários e institucionais da Reforma Protestante do século XVI, nos princípios presbiterianos (ou calvinistas). O seu caráter mais Reformado encontra-se na expressão dos Trinta e Nove Artigos de Religião, elaborado em 1563 como parte do estabelecimento da via média de religião sob a rainha Elisabeth I da Inglaterra.

Os costumes e a liturgia da Igreja da Inglaterra, expresso no Livro de Oração Comum (LOC), são baseados em tradições da pré-Reforma, com influência dos princípios da Reforma litúrgica e doutrinária de inspiração protestante. Possuem os sete sacramentos como na Igreja Católica, porém, compreende-se também como Protestante, na medida em que não está subordinada ao Vaticano nem ao papa.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

WILGES, Irineu. Cultura religiosa, As Religiões do mundo, vol I Petrópolis: vozes, 1984

 

HISTÓRIA do Anglicanismo, Disponível em:


 

VERONESE, Michelle. Igreja Anglicana: Do começo ao fim, Superinteressante. São Paulo: Abril, Agosto 2008. Disponível em:


Acesso em 15 de abril de 2012.

 

HISTÓRIA do anglicanismo dos primórdios até a idade média. Disponível em:


 

CALVANI, Carlos Eduardo. A tensão entre Substância Católica e Princípio Protestante no Anglicanismo, Revista Eletrônica Correlatio n. 10 - Novembro de 2006 (p. 75-86). Disponível em:

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